«És pó, e ao pó voltarás»
Quando? Amanhã? No próximo ano? Daqui a 20 anos? Que importa...
Esse grão de pó sobre a tua cabeça é o teu destino inelutável. Por isso emprega
bem os teus curtos anos, converte-te, volta-te para Cristo, que só Ele te pode
dar perdão e vida.
É assim que na Quarta-feira de Cinzas começamos a Quaresma, tempo
de conversão e austeridade, mas também tempo de uma alegria contida, a alegria
de um coração purificado. Trata-se de nos prepararmos para as festas pascais. A
Quaresma é o caminho para uma festa!
«Quando jejuardes, não mostreis um ar sombrio, como os hipócritas,
que desfiguram o rosto para que os outros vejam que eles jejuam. Em verdade vos
digo: já receberam a sua recompensa» (Mateus 6,16).
Escutemos bem estas palavras e apliquemo-las como norma de
conduta, não apenas na Quaresma mas em toda a nossa vida cristã, porque ela não
é senão uma longa preparação para as festas pascais definitivas.
«Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, para
que o teu jejum não seja conhecido dos homens, mas apenas do teu Pai que está
presente no oculto; e o teu Pai, que vê no oculto, há de recompensar-te»
(Mateus 6,17-18).
Que grandeza há no silêncio – não o silêncio nefasto da falta mas
no da virtude, que é perfeito quando dele não se tem consciência – e que força
se pode extrair dele. A alegria cristã é a simplicidade de uma fé, a seriedade
de uma esperança, a vitalidade do amor.
Na Quaresma a liturgia despe-se dos seus aleluias e glórias,
convidando-nos a um estreitamento de vida, a um despojamento do supérfluo, a um
tempo de germinação escondida e profunda, iluminada sempre por uma esperança e
uma espera. Ela convida-nos a entrar em nós mesmos para nos mergulhar nas
fontes da vida, em Cristo. Ela incita-nos a reencontrar o nosso verdadeiro
rosto num esforço de autenticidade e lucidez, na oração e na caridade, para
que, modelados à imagem de Cristo, sejamos capazes de uma comunhão mais
profunda no seu mistério.
Sim, porque o mistério de Cristo não é algo que esteja fora de
nós; ele é o que nós somos e o que somos chamados a ser. O seu drama é o nosso.
A nossa cruz não é outra que a de Cristo, é o seu amor em nós que a carrega. A
nossa verdadeira vida é a vida do Ressuscitado em nós. Se a liturgia nos conduz
pelos passos de Cristo é para nos ensinar o caminho que é também o nosso.
O drama que se evoca na Quaresma não é apenas a recordação de um
acontecimento passado mas a atualização do drama de Cristo, aqui e agora, para
nós, que nos coloca diante da opção decisiva da fé e do amor. Procuremos
portanto estar em harmonia com o espírito da liturgia deste tempo e acolher a
seiva de vida que nos oferece.
Um monge cartuxo
Trad. / edição: Rui Jorge Martins
Publicado em 19.02.2015
Trad. / edição: Rui Jorge Martins
Publicado em 19.02.2015
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