Da relação entre a Eucaristia e os restantes sacramentos
juntamente com o significado escatológico dos santos mistérios, irrompe o
perfil da vida cristã, chamada a ser em cada instante culto espiritual, oferta
de si mesma agradável a Deus. E, se é verdade que nos encontramos todos ainda a
caminho rumo à plena consumação da nossa esperança, isto não impede de podermos
já agora reconhecer, com gratidão, que tudo aquilo que Deus nos deu, se
realizou perfeitamente na Virgem Maria, Mãe de Deus e nossa: a sua assunção ao
céu em corpo e alma é, para nós, sinal de segura esperança, enquanto nos aponta
a nós, peregrinos no tempo, aquela meta escatológica que o sacramento da
Eucaristia desde já nos faz saborear.
Em Maria Santíssima, vemos perfeitamente realizada também a
modalidade sacramental com que Deus alcança e envolve na sua iniciativa
salvífica a criatura humana. Desde a anunciação ao Pentecostes, Maria de Nazaré
aparece como uma pessoa cuja liberdade está completamente disponível à vontade
de Deus; a sua Imaculada Conceição revela-se propriamente na docilidade
incondicional à palavra divina. A fé obediente é a forma que a sua vida assume
em cada instante perante a acção de Deus: Virgem à escuta, Ela vive em plena
sintonia com a vontade divina; conserva no seu coração as palavras que lhe
chegam da parte de Deus e, dispondo-as à maneira de um mosaico, aprende a
compreendê-las mais a fundo (Lc 2,
19.51); Maria é a grande Crente que, cheia de confiança, Se coloca nas mãos de
Deus, abandonando-Se à sua vontade.(102) Um tal mistério vai crescendo de
intensidade até chegar ao pleno envolvimento d'Ela na missão redentora de
Jesus; como afirmou o Concílio Vaticano II, « assim avançou a Virgem pelo
caminho da fé, mantendo fielmente a união com seu Filho até à cruz. Junto desta
esteve, não sem desígnio de Deus (Jo 19,
25), padecendo acerbamente com o seu Filho único, e associando-Se com coração
de mãe ao seu sacrifício, consentindo com amor na imolação da vítima que d'Ela
nascera; finalmente, Jesus Cristo, agonizante na cruz, deu-A por mãe ao
discípulo, com estas palavras: mulher, eis aí o teu filho (Jo 19, 26-27) ».(103) Desde a anunciação
até à cruz, Maria é Aquela que acolhe a Palavra que n'Ela Se fez carne e foi
até emudecer no silêncio da morte. É Ela, enfim, que recebe nos seus braços o
corpo imolado, já exânime, d'Aquele que verdadeiramente amou os Seus « até ao
fim » (Jo 13, 1).
Por isso, sempre que na liturgia eucarística nos abeiramos do
corpo e do sangue de Cristo, dirigimo-nos também a Ela que, por toda a Igreja,
acolheu o sacrifício de Cristo, aderindo plenamente ao mesmo. Justamente
afirmaram os padres sinodais que « Maria inaugura a participação da Igreja no
sacrifício do Redentor ».(104) Ela é a Imaculada que acolhe incondicionalmente
o dom de Deus, e desta forma fica associada à obra da salvação. Maria de
Nazaré, ícone da Igreja nascente, é o modelo para cada um de nós saber como é
chamado a acolher a doação que Jesus fez de Si mesmo na Eucaristia.
SACRAMENTUM
CARITATIS
DE SUA SANTIDADE
BENTO XVI