Entramos na Quaresma 2015
e a melhor maneira de entrar nela é pedir a humildade. Não pedimos a humilhação
porque esta perverte e destrói, mas a humildade que é a verdade e a justeza
humana e espiritual de que todos nós temos sede.
Durante este Quaresma, entremos
no deserto e façamos memória daquilo que nos diz o profeta Oseias (Os.2),
quando nos recorda que o Senhor conduziu Israel ao deserto para lhe falar ao
coração. Só no espaço enorme do deserto podemos abrir o coração e dialogar com
Aquele que nos ama. Ali, onde o silêncio é plano, se aprende a escutar os
nossos gemidos interiores e quem é que os não tem, mas também nos chegam com
maior acuidade os gemidos do mundo e como o mundo geme ferido pelas guerras,
amarrado pelas servidões de todo o género!
Nesta Quaresma, apoiemos a
nossa vida nos três pilares de que nos fala o Evangelho de S. Mateus de Quarta
Feira de Cinzas: a ORAÇÃO que nos faz escutar a Deus, nos revela o nosso mal,
no confronto com a tentação, mas nos revela também o Amor de Deus e a força do
alto, o Espírito Santo. Não foi o Espírito Santo que impeliu Jesus para o
deserto (Mc.1,12)? Com a força do Espírito, sairemos, como Jesus, vencedores da
tentação da riqueza (faz que estas pedras se convertam em pão, 1ª tentação), do
poder (tudo isto te darei, se prostrado me adorares, 2ª tentação) e da invulnerabilidade
(deita-te daqui abaixo que os anjos de Deus virão em teu auxílio, 3ª tentação);
o JEJUM que nos ajuda a escutar-nos a nós mesmos, e aferir a nossa relação com
as coisas, isto é: as coisas são criadas para, através delas, louvarmos e
reverenciarmos Aquele que as criou ou colocou ao nosso serviço; colocar as
coisas ao serviço da vida espiritual; vencer, se acaso é necessário, depois dum
discernimento, as afeições desordenadas para com as coisas e pessoas; a ESMOLA
que me faz escutar os outros que gritam por um pedaço de pão material, porque
têm fome e porque gritam também por outro pão não menos necessário: a consolação,
a esperança e a confiança que depositam na minha amizade e entrega.
Nesta Quaresma,
aproveitemos para retomarmos o nosso espírito, não para fazermos alguma
penitência especial, mas para a elevação gradual do nosso coração para a contemplação
de Deus Pai que nos criou, nos deu o seu Filho Jesus e nos santifica no
Espírito Santo, porque a contemplação não é somente dos místicos, mas de todos
os simples de coração. Tomemos a Quaresma como um tempo de libertação, um espaço
para respirarmos, para libertar o nosso coração das angústias e dos medos, dos
fantasmas que criamos. Aproveitemos também para revisitarmos os nossos hábitos.
Quais são os que me tiram a independência e que não nos deixam voltar ao
essencial, ao fundamental? Pensemos: encontramos tempo para falar, para
sentar-nos e resolver a dois ou a três os nossos problemas? Ou mergulhamos,
noite dentro, na Televisão, no Computador, na Internet e Facebook, sem uma
palavra para o companheiro ou companheira que está a nosso lado e sem nos
darmos conta até que, no dia seguinte temos um dia de trabalho e um compromisso
social.
E, no silêncio da noite, a
Quaresma convida-nos a repousar placidamente e a mantermo-nos vigilantes para não
consentirmos os pensamentos “negativos” mas sim os pensamentos “positivos”,
aqueles que, à maneira duma luz radiosa, alimentem a nossa esperança e nos
fazem levantar as mãos para o Senhor que dá. Se pedimos e temos o coração
aberto e as mãos estendidas para receber, o Senhor nos ensina a humildade e a
humildade nos abre à verdade do nosso ser e daquilo que é a vida verdadeira. É
preciso nesta Quaresma pedir e pedir sempre, porque pedir é reconhecer que eu
não me dou a vida a mim mesmo, mas consinto em recebê-la e abrir-me à
verdadeira Fonte. E a Fonte da vida jorra do lado aberto do Senhor que eu
contemplo no alto da Cruz na Sexta-feira Santa e que na noite da Páscoa me
transfigura com Ele. Não celebramos nós neste Domingo o Domingo da
Transfiguração? Da antecipação da Ressurreição?
Concluímos: viver a Quaresma
é colocar-nos à escuta do Espírito Santo. A Quaresma um dom a receber e não
muitas coisas a fazer, embora estas são necessárias como nos aponta o Papa
Francisco ao falar-nos na Mensagem para ao Quaresma que é necessário combater a
indiferença e olhar para o outro. A nossa atenção aos outros, as nossas partilhas
no grupos do C. V. X., nas Equipas de Nossa Senhora, no C.P.M. e noutros
Movimentos das comunidades das nossas Paróquias devem ser enraizados em Jesus
Cristo e num desejo grande de oração. Então, o Senhor poderá purificar o nosso
olhar, abrir as nossas mãos, unificar as nossas riquezas e capacidades para as
colocarmos ao serviço dos outros das nossas famílias e das mossas comunidades
paroquiais. Assim a Quaresma elevada a este nível nos indica o caminho do
despojamento do nossa egoísmo, do nosso “eu”. E não tenhamos medo de comprometer-nos
por este caminho de verdade que é o caminho da Humildade.
Padre José Augusto Alves de Sousa, SJ
Imagem do filme Il Vangelo secondo Matteo, Pier Paolo Pasolini.
Imagem do filme Il Vangelo secondo Matteo, Pier Paolo Pasolini.