SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE DE CRISTO “TOMAI E COMEI…”
Algumas reflexões a propósito da festa DO SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE DE CRISTO
1. Na Idade Média, perdeu-se muito o hábito de comungar com frequência, sempre que se participava na Eucaristia. Séculos mais tarde, as coisas pioraram, ainda mais, com o doutrina Jansenista que, em virtude do seu rigorismo e puritanismo, Deus devia permanecer oculto aos nossos olhares, como que atrás dum véu e Cristo Eucarístico devia distanciar-se daquele ou daquele que o quisesse comungar. Contra este rigorismo, vêm as revelações do Sagrado Coração de Jesus a Santa Margarida Maria Alacoque, cujas relíquias recebemos há dias, na Covilhã, na Igreja da Conceição e na do Sagrado Coração de Jesus da Freguesia de S. Pedro. O Sagrado Coração manifestou o desejo a Santa Margarida Maria de revelar aos homens o seu ardente amor para com eles esquecido pelas doutrinas jansenistas. Manifestou ainda o desejo desta proximidade, através dum gesto concreto da nossa parte: a devoção das primeiras Sextas-Feiras de cada mês e da Comunhão Eucarística frequente. A devoção ao Sagrado coração de Jesus e a participação nas Primeiras Sextas - Feiras quer incutir nos cristãos a participação no alimento e na bebida que mata a fome e a sede para sempre. Não se trata de contabilizar as primeiras Sextas – Feiras (quantas fiz…, quantas me faltam…), mas de manifestar a nossa fidelidade a Deus que se quer dar a nós na Eucaristia e viver connosco a íntima aliança estabelecida no dia do nosso Baptismo.
2. Ainda hoje perduram na Igreja, depois do Concílio Vaticano II e do seu belíssimo texto sobre a Eucaristia: “Sacrossanctum Concilium”, resquícios de jansenismo, esse alheamento da participação na Comunhão do Corpo e do Sangue do Senhor. Quantos cristãos há que se limitam a assistir à missa e passam tempos e tempos sem comungarem. Ou, então, vamos a confessar-nos, uma vez ao ano, por altura da Páscoa, para cumprir o preceito. Comunga-se uma vez, duas vezes, quando muito três… e, depois espera-se pela Confissão do ano seguinte!... Era como se eu apenas me alimentasse durante um dia, dois dias, quando muito três!...Ou, pelo contrário, quantos cristãos levam uma vida inteira a comungar sem se aproximaram do Sacramento da Reconciliação chamado também Sacramento da Confissão ou Penitência. Evidentemente que a comunhão requer uma preparação e nisso, cada um deve ser exigente perante si mesmo e perante Deus...Cada um e cada uma há-de ver, diante do Senhor que perdoa, sempre que me aproximo d´Ele, se estou ou não de bem com Deus e com os irmãos para participar na Eucaristia. S. Paulo não deixava de interrogar os cristãos de Corinto sobre este aspecto da preparação.
3. Mas comungar é uma palavra que não deve ser tomada ao de leve, pois comungar significa “fazer comunhão”, “fazer comunidade”. Vou à Missa não para assistir pura e simplesmente mas para participar num alimento que me faz corpo com Cristo e mediante Cristo com os outros. A comunhão constrói-se com a participação de todos. Tanto o pão como a bebida são fruto do trabalho dos homens e tanto um como outro se prestam à comunhão de pessoas. Sento-me à mesa com a família e com os amigos e gosto de ir á taberna para beber com outros um copo de vinho. Mas muitas vezes, também a busca de alimento e de bebida me podem levar a rixas e contendas ou a desigualdades gritantes. Já S. Paulo se queixava disto fortemente junto dos Coríntios. Uns tinham tudo e outros não tinham nada. Cristo faz-se nosso pão da vida e este pão da vida comunica-me uma vida que a morte não pode destruir e Ele se torna bebida, uma bebida para a vida eterna. Participar na Corpo do Senhor faz-me um só corpo com todos os irmãos.
4. Todos devemos compreender a situação dum idoso ou duma idosa, dum doente ou duma doente que nos diz: “não posso ir à Missa, mas ouço a Missa na Televisão e na TVI, onde a Missa é tão bonita!... Muito bem, com o idoso ou com a idosa. Não lhes pudemos criar confusões na sua fé com os nossos raciocínios. Mas ouvir a Missa na televisão é sempre um acto de devoção e não uma participação comunitária. Pessoas há que, ao não poderem ir à Igreja, se não ouvem a Missa na Televisão, pensam que faltam ao preceito e ficam com a consciência carregada. A pessoa, sempre que puder tem obrigação de ir á missa para fazer comunidade. Mas, ao não poder, evidentemente que, ao assistir à Missa pela Televisão reza e põe-se em sintonia com os milhares e até milhões de espectadores que, por necessidade, ouvem a Missa por este meio.
5 A Eucaristia não se celebra para nos dar a presença real e para guardarmos o Santíssimo nos nossos sacrários, como se a presença de Cristo em toda a humanidade e em todas as coisas fosse uma presença irreal. O pão Eucarístico é não tão só e apenas para ser olhado, contemplado, incensado ou passeado pelas ruas das nossas aldeias e cidades por ocasião da festa do Corpo de Deus. As “Bênçãos” e “Exposições” do Santíssimo Sacramento” não teriam sentido, se não se referissem à refeição ritual pascal e se não fizessem memória da última refeição de Cristo: “ Fazei isto em memória de mim”. (Luc. 22,19) A memória é aquela faculdade que nos torna presente o passado. Presente ao espírito. Mas a memória eucarística leva-nos muito mais longe. Ela torna-nos realmente contemporâneos à Páscoa de Cristo, faz de nós seu próprio Corpo, seu Corpo actual. Este corpo actual, toma, para nós, o nome de Igreja, isto é, de Assembleia e de Reunião. Mas esta unanimidade não terá sentido se não refazemos aquilo que Cristo fez, isto é, para além do rito que celebramos, aceitamos como Cristo, entregar a nossa vida. Não estamos aqui a falar necessariamente de actos heróicos, como o martírio, mas há muitas maneiras de dar a sua vida, o seu tempo, as suas forças, o seu amor. Isto não se faz uma vez por todas, mas pode durar toda uma vida. Por isso mesmo, o pão que nós tomamos e damos em alimento, o pão da nossa vida e da vida de Cristo é o pão quotidiano. Cristo era, de alguma maneira, presente no maná da primeira passagem, através do deserto da fome e da sede (Êxodo 16). Certamente que hoje tudo continua com Ele presente para nosso alimento e bebida. Está nos nossos desertos (Ver: Marcel Domergue em Croire Aujourd´hui)
P. José Augusto Alves de Sousa S. J.
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