A PARÁBOLA DOS TALENTOS (Mt. 25, 14-3O) que nos conta a história do Mestre que se ausenta aparece, muitas vezes,
nos Evangelhos. Vimos esta ausência na Parábola dos Vinhateiros homicidas que
meditámos, uns Domingos atrás, na Parábola das Dez Virgens que era o tema da
meditação do Domingo passado e, hoje, na nesta Parábola dos Talentos que
acabamos de ouvir. Todas estas Parábolas têm um denominador comum: trata-se dum
senhor que se ausenta e que, tempos mais tarde, vem para colher os frutos…A
Parábola dos Talentos contem uma lição cheia de modernidade. O “terceiro servo”
é condenado sem ter cometido qualquer acção má. O seu único erro consiste “em
não fazer nada”: não arrisca o seu talento, não o faz frutificar e o conserva
intacto, num lugar segura (J.A.Pagola).
EXTREMA CONFIANÇA DE DEUS: A CRIAÇÃO
ENTREGUE NAS NOSSAS MÃOS: A ausência de Deus, deixando o homem
entregue à sua liberdade faz pensar numa grande interrogação que já vem desde o
Antigo Testamento: Que faz Deus? Dorme? Está surdo? Onde está o teu Deus,
perguntam os descrentes, os sem Deus, ao homem bíblico e a mim que me encontro
desamparado (Salmo 42 e 11)? Onde estava Deus, durante o Tufão que se abateu sobre as Filipinas, há uns tempos
atrás, causando milhares de mortos, perguntavam-se os habitantes das ilhas
afectadas e nós, juntamente com eles? Onde está Deus nas grandes epidemias que
dizimam vidas? Uma pergunta que se coloca a propósito das grandes catástrofes e
até genocídios. Jesus não insistiria tanto sobre a ausência do Mestre, se a
nossa crença espontânea não tivesse a tendência de ver em Deus o autor de tudo
o que passa debaixo sol: Inconscientemente ou conscientemente dizemos: pois é, Deus enviou-lhe esta doença, esta
prova. Coitado!..Ora o Mestre da Parábola dos Talentos ausenta-se. O
Criador ausenta-se, entra no repouso do Sétimo Dia e entrega a criação nas
nossas mãos, confiando-a à nossa liberdade para que a possamos gerir e dominar.
Concluímos, Deus não quer o nosso
mal. Ele não só está inocente sobre aquilo que nos acontece, mas é inimigo das
nossas desgraças como o revelam os actos de Cristo. Deus não quer as
catástrofes, mas os acontecimentos que
se sucedem convidam-nos à reflexão. Santo Inácio dizia: “entrega-te à acção
(livremente, vigorosamente) como se Deus fizesse tudo e tu nada. Agradece a Deus
como se tu tivesses feito tudo e Ele nada”. Nós temos por isso de agradecer a Deus,
porque nos fez à sua imagem, criadores. Os talentos vêm do Mestre, de Deus, mas
a nós pertence encarregar-nos deles e de tomarmos conta de tudo aquilo que a
vida nos oferece, nos propõe e nos impõe. E o que sucedeu e sucede com aqueles
a quem Deus confia os Talentos para os gerir?
A NÓS A GERÊNCIA E O FAZER FRUTIFICAR
OS TALENTOS: A primeira coisa que temos de dizer é que
Deus apenas nos confia os talentos, mas não nos diz o modo como os vamos pôr a
render. Isso depende da nossa imaginação, do nosso trabalho. O que devem fazer
os servos da Parábola é puxar pela cabeça e empregar todo o seu engenho e esforça.
O Decálogo (as Dez Palavras) manda-nos que amemos a Deus e ao próximo, mas não
nos diz o modo de fazê-lo. Enumeram-se simplesmente as condutas que balizam o
caminho: “não mataras, não cometas adultério...” Se saímos delas, escorregamos e
faltamos ao amor. O amor não se comanda.
Não vem do exterior, mas sai de dentro de nós mesmos. O terceiro servo não é censurado pelo que fez mas pelo que deixou de
fazer. Pecado de omissão. Não
digamos: eu não mato nem roubo, nem vejo o meu pecado, porque Jesus no Capítulo
25 de S. Mateus diz-nos: “Eu tive fome e não me deste de comer…” O valor das
nossas vidas mede-se sobretudo pelo bem que omitimos ou deixamos de fazer. O rico
avarento é condenado não porque faz boas refeições, mas porque não olha nem sequer
para Lázaro que jaz à sua porta (Lc.16, 19-31) Concluindo: O Senhor não nos diz como amar, mas dá-nos um coração
para amar. Deus está ausente enquanto causa de tudo aquilo que acontece mas ele
está presente nas nossas decisões e nas nossas acções. Está activo na energia e
inteligência que os servos gastam para colocar a render os talentos. Mas não
está presente na inércia daquele que enterrou o talento na terra, imagem da
sepultura e da morte. Quem não trabuca
não manduca e apressa a sua morte cavando a sua sepultura. Ao contrário os
dois primeiros servos entraram para a sala do banquete, na alegria do seu
Senhor.
UMA AUSÊNCIA-PRESENÇA: De certa maneira, o Mestre ausentou-se, mas, em realidade, Ele está
presente e nós é que temos o poder de cortar com Ele e, então, ficamos
abandonados à nossa sorte e tornamo-nos ramos secos como nos explica Jesus no
Evangelho de S. João15.1-8. Nós fazemos frutificar os talentos na medida em que
permanecemos n’Ele e Ele permanece em nós. Tudo o que fazemos de bom, é obra de
Aliança, de matrimónio entre a liberdade do homem e a liberdade de Deus. A
nossa parábola dos talentos põe o acento do lado da liberdade do homem, mas
mesmo assim é o Mestre que nos confia os talentos, esperando a volta de Cristo.
Daqui até lá, não fazemos senão um com o Pai e o Filho no Espírito (Marcel
Domergue)
DEUS E O TERCEIRO SERVO; QUEM É O NOSSO
DEUS? É lastimosa e até perversa a imagem que o terceiro
servo, nos faz de Deus. Chega a chamar preguiçoso a Deus, pois diz: “Eu sabia
que tu és um homem severo que colhes onde não semeaste, tive medo e enterrei o
teu talento”. Para ele, Deus é preguiçoso, pois colhe onde não semeou. Que
acusação!.. Nesta mesma tentação, caíram Adão e Eva que se deixaram levar pela voz
do tentador: Deus é mentiroso, diz o demónio, porque Ele vos disse: se comeis
deste fruto morrereis. Ora isto não é verdade. Pelo contrário: se comeis do
fruto, vós vos vereis como Deus e Deus não quer isso, porque Ele é invejoso e
avaro da sua natureza, dos seus bens e não os quer comunicar a ninguém Esta tese
do tentador é completamente contrária à conduta de Cristo em Filipenses 2 (Ele
que era de condição divina não fez valer ciosamente a sua condição de ser como
Deus”). Eis aí, o inimigo do Homem que é inimigo da Vida. É a tentação de
Prometeu, o deus grego, que quis roubar o fogo a Deus para ser como Deus.
Traduzindo isto do Génesis em palavras mais compreensíveis, dizemos: temos
também nós a tentação de ver a Deus como um senhor exigente, um vigilante cioso
do seu dever, uma espécie de câmara de vigilância que nos surpreende nos
mínimos actos, um juiz severo? Por graça do mesmo Deus, não vemos assim o nosso
Deus, pois isso seria desconfiar d’Ele e a desconfiança é completamente contrária
à fé.
PERGUNTAS: Que faço dos tesouros do reino que o senhor me encomendou? Como vivo o
meu Baptismo, o meu Matrimónio? Como aprofundo a minha fé e a minha confiança
em Deus? Como ponho a render a meu favor, a favor da minha família e dos
outros, estes talentos que o Senhor me confiou? Como participo na missão de
divulgar o Evangelho da alegria? Será válida a acusação que fazem aos cristãos,
quando se diz que passam a vida a olhar o céu, esquecendo-se da terra? Como
leio o Evangelho de Mateus Capítulo 25? Contento-me com presumir que conheço o
Mestre (também o terceiro servo dizia que o conhecia, embora muito mal) e,
depois, nada fazer para pôr a render o capital que me confiou?
CONCLUINDO: Feliz o servo fiel. Temos que prestar contas daquilo que nos foi
confiado e é isso que constitui a nossa grandeza. Deus toma-nos de tal modo a
sério que Ele nos torna responsáveis pela gerência dos seus bens. A todos pede
para lhe darmos contas, mas Ele não pede a cada um a mesma coisa. Pede somente
em função daquilo que a pessoa recebeu e que humildemente lhe pode oferecer. Não
tenhamos medo de oferecer a Deus os frutos magros dos pequenos arbustos que
somos, porque o que Deus nos pede é acreditar no amor que nos dá a nossa
fecundidade. Uma atitude de medo como foi a do terceiro servo, não deve ser a
nossa, mas sim um sentimento de confiança e abandono. É ISTO A FÉ!..
Bibliografia consultada: José António Pagola: BUENAS NOTICIAS e Marcel
Domergue: DECOUVRIR LA PAROLE DE DIEU
P. José Augusto Alves de Sousa
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