REFLEXÃO
SOBRE OS TEXTOS: IS.40,1-5.9-11, 2PED.3,8-14, MC.1,1-8
O
Advento é, para nós, cristãos, um tempo forte, durante o qual, não somente em
particular, mas em comunidade, se espera o Senhor na fé e não na visão, como
diz S. Paulo na Segunda Carta aos Coríntios 4,18.
Esperamos o Reino, convictos de que, caminhando na Fé, ele está ao nosso
alcance. Não experimentamos ainda a
salvação como uma vida que não é mais ameaçada pela morte, pela doença, pelas lágrimas,
pelo pecado... Há a salvação trazida por Cristo que nós conhecemos na remissão dos nossos pecados, mas a
salvação plena, a salvação de todos os homens e de todo o universo ainda não
chegou à plenitude, e por isso, o Advento será sempre a espera do “dia do Senhor” como pensavam os
Judeus, o “dia da libertação”, o “dia do Messias”. O Advento leva-nos a
esperar o Senhor no fim dos tempos. Nestes dias do Advento, não nos comportemos
como se Deus fosse alguém que está para trás de nós, como se nós não encontrássemos
Deus senão no Menino de Belém. Mas perguntemos,
mais uma vez, neste Advento: Sabemos buscar a Deus no nosso presente e futuro,
como sentinelas impacientes que vislumbram, na aurora, o Sol nascente, sentindo na coração a urgência da sua vinda?
Deixamo-nos interpelar pelo grito do Padre Theilhard de Chardin: Cristãos,
continuamos empenhados em alimentar sempre viva na terra, a chama, sempre vivo o
desejo da vinda de Deus às nossas vidas?
OS
DOIS ARAUTOS DO ADVENTO: ISAÍAS E JOÃO
BAPTISTA: A primeira leitura e o Evangelho utilizam a imagem duma
estrada que evoca a longa marcha de Israel em direcção à Terra Prometida, ao
repouso de Deus. Para o Senhor que nos ama nada é impossível. E Deus quer assim
incutir esta confiança aos exilados da Babilónia destroçados por se verem
privados da sua terra e, sobretudo, do seu Templo, onde ofereciam os
sacrifícios e os holocaustos e onde dirigiam as suas orações a Deus. O Profeta
que traz esta Boa Notícia, o PRIMEIRO
ARAUTO do Advento é o PROFETA ISAÍAS
que grita aos exilados de Babilónia: “abri na estepe um caminho para o
nosso Deus” e o oráculo deste arauto começa com as palavras de Deus.”Consolai, consolai o meu povo”. Em
todos os que sofreram, durante anos, o jugo da escravidão, a humilhação e o
exílio, desponta um raio de esperança,
neste anúncio do regresso à Terra de Israel. Esta voz é a voz de Deus que se
identifica com o seu povo, porque, com ele, viveu também o exílio e, agora, se
propõe Ele mesmo ir á frente da caravana a cominho da Terra Prometida. É esta,
também, a imagem de confiança que se nos oferece a nós, na caminhada para a terra
da salvação na confiança de que venceremos todos os obstáculos porque Deus está
connosco, Temos que abrir uma clareira
no deserto e rasgar uma estrada nas nossas vidas, uma estrada para Deus. Regressa
a esperança e o povo se recordará sempre qual é a sua vocação, a fé como
resposta à fidelidade de Deus que nunca o abandona. No Evangelho de S. Marcos, encontramos o SEGUNDO ARAUTO do Advento, João Baptista que, como o antigo arauto,
também ele diz: “preparai os caminhos do
Senhor e endireitai as suas veredas”. Mas o segundo arauto chama á conversão, isto é, à mudança de
mentalidade e de costumes. Não basta nesta conversão dar um salto quantitativo,
fazer esta ou aquele penitência, muito válida se feita com alegria interior, pois
torna a vida uma verdadeira e nova criação da pessoa. Este segundo arauto chega
a dizer que devemos fazer uma declaração
pública dos nossos erros para nos reformarmos a nós mesmos e concorrermos, deste
modo, para uma sociedade mais justa e fraterna. Não podemos ficar em palavras
ou em boas intenções, mas operar uma reviravolta na nossa vida para podermos
também operar uma reviravolta na sociedade. Este segundo arauto lembra-nos a
nossa vocação e desperta-nos para
estarmos vigilantes como dizíamos no primeiro domingo do Advento. E, em
terceiro lugar, este arauto aviva a
renovação da memória, lembrando o nosso baptismo na água e no Espírito. Foi
assim que um dia o povo com Josué, atravessando o Jordão chegou à terra
prometida. É para aí que caminhamos neste Natal e o segundo arauto não deixa de
apontar esse personagem. Depois de João,
há-de vir Outro. João é uma voz
que clama no deserto, mas não a Palavra.
Ele nem sequer é digno de lhe desatar as sandálias. E o seu baptismo será um baptismo no Espírito, o baptismo
definitivo e purificador, porque sobre o baptizado descerá o vento Santo, sopro de Vida, o Espírito Santo.
A
MONTANHA A NIVELAR, CONDIÇÃO PARA ACOLHERMOS A MENSAGEM DE ISAÍAS E JOÃO
BAPTISTA: Quantas dificuldades temos para nivelar um pedaço de
terra e nela plantar os nossos haveres. Hoje, tudo é mais fácil com os tractores
e outros instrumentos agrícolas. A montanha de que fala Isaías é símbolo das nossas dificuldades que julgamos, às vezes,
intransponíveis. A Bíblia fala muitas vezes do orgulho, símbolo dos montes elevados que desafiam as empresas dos
homens e dos lugares altos onde os homens celebram os seus cultos e se entregam
a devaneios idolátricos. As ravinas a preencher têm algo a ver com os nossos
túmulos, com o vazio dos nossos túmulos, isto é, das dificuldades em que nos
atolamos sem esperança de saída. São os naufrágios que cavamos! Com a vinda de
Cristo, o homem renasce e a Escritura anuncia-nos o último inimigo a abater, a morte (1Cor,15,26). A conversão que nos
é exigida é a conversão à vida. Mesmo que a terceira leitura, nos fale de
reconhecer os nossos pecados, não pensemos numa conversão moral, porque esta não é senão a consequência da nossa
volta à vida. E aquilo a que chamamos pecado, não se define, em primeiro lugar,
como uma contravenção a uma lei, mas como aliança com a morte. Deus ao vir a
nós em Jesus Cristo neste Natal não nos trará outra coisa senão a vida!..
CONCLUINDO.
Fixemo-nos
nas ravinas cheias e nas montanhas
niveladas da primeira leitura. Isto é uma imagem da nossa conversão. Não
deixemos neste Natal que se aproxima de encher os vales profundos nas nossas
vidas caracterizados pelas separações tão dolorosas que apagam todos os nossos
sorrisos e nos impossibilitam de apertos de mão pela distância que cavamos.
A
liturgia de hoje nos convida à esperança, a crer que, no meio
das dificuldades da vida, das perseguições que sofrem os cristãos e que no meio
das realidades mais duras, é possível um futuro melhor, porque o Senhor é fiel para
com aqueles que «assumem” os valores da verdade, da justiça, da fraternidade.
Todas estas esperanças a que nos convidam as leituras de hoje, as lemos com
Jesus, sobretudo neste tempo de espera alegra do Natal. Espera de um novo
mundo, uma utopia certamente, mas a utopia vivida em Deus que gera uma
esperança sempre jovem e mais bela. Que esta esperança não se apague no meio da
crise, das dificuldades do dia-a-dia para podermos levar uma vida digna e fiel.
Isto é Natal, isto é Jesus Cristo no meio de nós. E não é Ele o EMANUEL?
Padre José Augusto Alves de Sousa S.J.
Presépio de Machado de Castro na Basílica da Estrela - Lisboa
Nenhum comentário:
Postar um comentário